terça-feira, 8 de maio de 2012



BELARMINO BICAS

Depois da festa beneficente, em que servíramos justos, Belarmino Bicas, prezado companheiro a que nos afeiçoamos, no Plano Espiritual, chamou-me à parte e falou, decidido:
- Bem, já que estivemos hoje em tarefa de solidariedade, estimaria solicitar um favor...
Ante a surpresa que nos assaltou, Belarmino prosseguiu:
- Soube que você ainda dispões de alguma facilidade para escrever aos companheiros encarnados na Terra e gostaria de confiar-lhe um assunto...
- Que assunto?
- Acontece que desencarnei com 58 anos de idade, após 20 de convicção espírita. Abracei os princípios codificados por Allan Kardec, aos 38, e, como sempre fora irascível por temperamento, organizei, desde os meus primeiros contactos com a Doutrina Consoladora, uma relação diária de todas as minhas exasperaçãoes, apontando-lhes as causas para estudos posteriores... Os meus desconchavos, porém, foram tantos que, apesar dos nobres conhecimentos assimilados, suprimi, inconscientemente, 22 anos da quota de 80 que me cabia desfrutar no corpo físico, regressando à Pátria Espiritual na condição de suicida indireto... Somente aqui, pude examinar os meus problemas e acomodar-me às desilusões... Quantos tesouros perdidos por bagatelas! Quanta asneira em nome do sentimento!...
E, exibindo curioso papel, Belarmino acrescentava:
- Conte o meu caso para quem esteja ainda carregando a bobagem do azedume! Fale do perigo das zangas sistemáticas, insista na necessidade da tolerância, da paciência, da serenidade, do perdão! Rogue aos nossos companheiros para que não percam a riqueza das horas com suscetibilidades e amuos, explique ao pessoal na Terra que mau-humor também mata!... Foi então que passei à leitura da interessante estatística de irritações, que não me furto satisfação de transcrever:
 
Belarmino Bicas – Número de cóleras e mágoas desnecessárias com a especificação das causas respectivas, de 1936 a 1956:

1811 em razão de contrariedades em famíla;
906 por indispor-se, dentro de casa, em questão de alimentação e higiene;
1614 por altercações com a esposa, em divergência na conduta doméstica e social;
1801 por motivo de desgostos com os filhos, genros e nora; 11 por descontentamento com os netos;
1015 por entrar em choque com chefes de serviço;
1333 por incompatibilidade no trato com os colegas;
1012 em virtude de reclamações a fornecedores e logistas em casos de pouca monta;
614 por mal-entendidos com vizinhos;
315 por ressentimentos com amigos íntimos;
1089 por melindres ante o descaso de funcionários e empregados de instituições diversas;
615 por aborrecimentos com barbeiros e alfaiates;
777 por desacordos com motoristas e passageiros desconhecidos, em viagem de ônibus, automóveis particulares, bondes e lotações;
419 por desavenças com leiteiros e padeiros;
820 por malquistar-se com garções em retaurantes e cafés; 211 por ofender-se com dificuldades em serviços de telefones;
90 por motivo de controvérsias em casas de diversões;
815 por abespinhar-se com opiniões alheias em matéria religiosa;
217 por incompreensões com irmãos de fé, no templo espírita;
901 por engano ou inquietação, diante de pessoas imaginários ou da perspectiva de acontecimentos desagradáveis que nunca sucederam.
Total: 16.386 exasperações inúteis.

Esse, o apanhado das irritações do prestimoso amigo Bicas: 16.386 dissabores dispensáveis em 7.300 dias de existência, e, isso, por quatro lustros mais belos de sua passagem no mundo, porque iluminados pelos clarões do Evangelho Redivivo. Cumpro-lhe o desejo de tornar conhecida a sua experiência que, a nosso ver, é tão importante quanto as observações que previnem desequilíbrios e enfermidades, embora estejamos certos de que muita gente julgará o balanço de Belarmino por mera invencionice de Espírito loroteiro.


FONTE: "CARTAS E CRÔNICAS" Francisco Cândido Xavier/ Irmão X - Cap.16

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